domingo, 3 de maio de 2009

Primavera Suíça

Desde que voltei da viagem das minhas “férias”, fiquei com preguiça de ir viajar de novo. Na verdade, acho que não foi preguiça, porque até pesquisei viagens para o norte da Itália e para Viena, mas o preço fez com que eu ficasse com essa preguiça. Por isso, decidi ficar por aqui e aproveitar um pouco da primavera suíça.
Como já havia dito, fui jogar golfe. Eu realmente estava com vontade de fazer isso, muito talvez para usar os tacos novos e ver como me sairia com eles. Uma semana depois do meu retorno, numa terça-feira, dia 21 de abril, haveria um torneio de golfe que me disseram que era imperdível. Decidi comemorar o feriado no Brasil, participado e perdendo algumas aulas, apesar de algumas indefinições como o meio de se chegar até o clube de golfe. Alguns dias antes, olhei na internet onde era o campo de golfe e parecia perto de uma estação de trem (algo como uns 700 metros). Como não queria passar vergonha no torneio, precisava fazer uma seção de treinamento prévio e decidi experimentar no sábado anterior ao torneio em ir ao campo por conta própria, para bater algumas bolas no driving range. O caminho até a tal estação foi bem rápido, em torno de 20 minutos e lá chegando, já sabia o caminho pelo qual seguir, já que o trem havia passado ao lado do clube. Porém, fui parar numa vila minúscula e fui caminhar na direção da linha de trem. O problema é que não havia uma estrada para caminhar ao lado da linha, fazendo com que eu tivesse que andar por uma espécie de fazenda que tinha ao lado. Não sei se era proibido, porque não vi nenhuma cerca em volta, mas a grama estava bem alta e tinham alguns morros no caminho, que faziam com que a já pesada sacola de golfe ficasse mais pesada ainda. Depois de vinte minutos de caminhada cheguei e fui entender como funcionava para jogar lá. Sendo associado da associação de golfe da faculdade tinha um bom desconto e não foi caro pagar por algumas bolas para treinar. Os tacos se saíram bem, apesar do jogador estar um pouco enferrujado. Conheci um pouco do clube, que possui um campo com 27 buracos além de mais alguns de treino, além de ser bastante organizado. Depois de mais ou menos duas horas ali, onde aproveitei para tomar um lanche também, decidi tomar o caminho de volta e andar carregando a bolsa de novo. No final essa caminhada acabou sendo um bom treino para o campeonato, já que nele tive que carregar minha bolsa nas costas.
Na terça-feira, então, consegui uma carona para ir até o campo com o presidente da associação de golfe da faculdade que além de aluno da mesma, é um ótimo jogador de golfe. No geral, o campeonato foi bom e deu para se divertir bastante. Não acabei nem em último nem em primeiro, mas foi um bom resultado para quem não jogava a tanto tempo e nem conhecia o campo. O campo é um pouco diferente do de Mogi, tendo a distância para os buracos mais curta, porém exigindo uma precisão maior, ou seja, tendo que jogar mais reto e com mais controle. Resultado: nos primeiros buracos sofri para por a bola no campo e acabei perdendo algumas. Mas logo comecei a jogar melhor e consegui fazer 29 pontos, no sistema que eles usavam para fazer a classificação. Chama-se Stableford e, ao contrário do jeito tradicional, ganha quem fizer mais pontos. Os pontos são contados da seguinte maneira: se o jogador fizer seu par ajustado pelo seu handicap num buraco ganha dois pontos, se fizer um acima desse par 1 ponto e acima disso zero. O mesmo vale para baixo, se fizer uma tacada abaixo do seu par ganha três pontos e assim por diante... A vantagem desse método é que desconsidera os resultados muito ruins que um jogador obtém num buraco. Meus companheiros de jogo foram dois suíços, alunos da universidade de se comunicavam comigo em inglês. Ao final do jogo, teve um jantar que estava bastante bom e pude conhecer outras pessoas. No final, acabei pegando carona de volta com o mesmo que havia me levado e cheguei em casa cansado, mas não muito, depois do grande exercício que fiz (deve ser pelo treinamento de subir a montanha para a faculdade todo o dia).

Só alguns comentários sobre a temperatura por aqui, que não lembro se já fiz. Depois que eu voltei da Finlândia, o tempo aqui estava ótimo, com termômetros marcando temperaturas de em torno de 15 graus, mas estando talvez mais quente no sol. Tava dando pra sair só de camiseta quando tinha bastante sol, só sentindo um pouco de frio na sombra quando ventava. Essa semana, última semana de abril, entretanto, o tempo mudou um pouco, fazendo bastante frio de novo, com a temperatura chegando perto de zero novamente. Além disso, choveu um pouco, mas não muito. Esse fim de semana está nublado, mas com temperaturas agradáveis. Os suíços falam que o clima de St. Gallen é bem ruim mesmo, quando comparada com de outras partes da Suíça, por exemplo. Eles falam que o tempo é aleatório e pode fazer muito calor e muito frio na mesma semana. Não posso dizer que não estou acostumado com isso, porque no Brasil, pelo menos em São Paulo, é mais ou menos assim. Porém, há uma grande diferença, nesse esse aspecto entre os dois continentes. Aqui, na Europa, as estações do ano são realmente definidas, ao contrário do Brasil. Antes, no inverno, eu ficava me perguntando como seria no verão e na primavera, sempre quente? Haveria vida além da neve? Como já perceberam, a resposta é que sim e não. Não é sempre quente, nem sempre frio, é realmente uma estação intermediária. Não há mais neve e gelo, o que torna a paisagem totalmente diferente. Ao invés de um branco infinito, um verde pelos campos e montanhas. A natureza realmente se renova aqui de maneiras bem perceptíveis. Sobre isso, posso dizer que uma das minhas melhores compras que fiz nessa viagem, foi o livro do Fernando Pessoa, sob o heterônimo de Alberto Caeiro, numa edição bilíngüe, em português e alemão. Ler as poesias quando se está no trem vendo as paisagens é uma grande experiência. Até eu, que como todos sabem, sou muito mais de cidade do que de campo, passo a gostar mais dessas coisas de natureza com essa viagem para a Europa, além de é claro, entender muito melhor esse livro.

Quanto à relação entre as estações de ano e as cidades há muito que ser dito. Essa relação parece contraditória, já que as estações do ano são uma expressão da inevitabilidade da natureza e as cidades são a anti-natureza. Porém o que acontece por aqui é que as cidades não são grandes o suficiente para serem anti-naturais como São Paulo, por exemplo. Apesar de que o tamanho de uma cidade não é um fator determinante para se explicar essa relação, já que Londres, por exemplo, tem o Hyde Park que é grande o suficiente para uma pessoa se sentir fora da cidade. Mas pode ser dito que o Hyde Park não é natural, sendo “construído” dentro da cidade. É possível refutar esse argumento falando que o parque Trianon é natural. Afinal, então, o que é a cidade e o que é natureza? Acho que não dá pra se definir muito bem como já se deu pra perceber, mas que os europeus sabem lidar muito bem com isso, posso dizer que sim. Enquanto que fora das cidades dá pra se ver o branco se tornando verde, na cidade, essa diferença é muito mais sutil. Não há mais neve nas ruas, isso é óbvio, mas a grande diferença que eu percebo, está nas pessoas. A temperatura possui um papel fundamental nessa mudança, mas não é o único determinante disso. As pessoas não precisam ficar mais escondidas junto aos seus aquecedores e assim, elas aparecem agora. Parece que nascem pessoas nessa época, porque com certeza, eu não tinha visto tanta gente antes. Pode até fazer frio de novo, como fez essa semana, mas as pessoas continuam vindo para as ruas, o que mostra que não é a temperatura o fator único da mudança. O que eu percebo como outro fator é uma mudança na atitude e no nodo de pensar das pessoas. Elas simplesmente pensam “começou a primavera, então tenho que sair de casa”. Essa mudança de consciência não é apenas demonstrada por uma aceitação de um fato natural por um grupo grande de pessoas. Mas existe, na linguagem dos antropólogos, a presença dos rituais que marcam essa mudança. É aí que entram os festivais, como o que a Carol descreveu que acontece na Finlândia. Aqui na Suíça também há festivais de primavera, como já vou descrever.

O festival de primavera que eu presenciei aqui na Suíça, mas precisamente em Zurique foi o Sechseläuten, que acontece toda terceira segunda-feira de Abril naquela cidade. É um grande evento que é transmitido pela televisão principalmente por uma parte bastante simbólica que é ponto alto da festa: a queima do Böögg, um boneco de neve. Às seis da tarde (Sechseläuten quer dizer algo como o tocar dos sinos às 6 horas) uma fogueira com o boneco de neve simbólico no topo é acesa e eles só comemoram quando a cabeça dele explode. O significado disso é que quanto mais rápido isso acontecer melhor, em termos de temperatura, vai ser o verão. Bom, depois dessa breve explicação, vou relatar como foi esse dia.
Eu já havia lido sobre esse festival antes, mas não sabia certeza se ia, já que era em plena terça-feira e no dia seguinte seria o jogo de golfe e eu tinha que terminar de escrever um exercício para deixar para o meu amigo entregar numa aula que eu ia perder. Porém, logo de manhã, recebi uma mensagem de uma amiga me chamando para ir para Zurique junto com alguns outros, e acabei aceitando, já que é muito melhor ir para esses lugares com companhia. Tive porém, uma aula antes disso, logo após o almoço. Por volta das três da tarde pegamos o trem para Zurique, eu, a Luciana e o Felipe, que são da GV e a Débora, uma argentina. Chegando em Zurique, percebemos que era alguma coisa importante, pois todo o comércio estava fechado e a cidade estava bastante cheia. Não tínhamos muita informação a respeito de como seria o festival, por isso perguntamos na seção de informações. Entendemos que havia uma parada que ficava dando voltas em torno da cidade e fomos para lá ver. Era como um desfile de carnaval, com vários grupos, cada simbolizando algum tipo de profissão e, assim, vestidos com roupas relacionadas e carregando objetos característicos. Havia também os “carros alegóricos” que iam junto a esses grupos. Alguns desses, tinham bandas que iam tocando ao desfilar. Só um detalhe, que eu não entendi muito bem, é que só os homens desfilavam e se vestiam a caráter, enquanto as mulheres ficavam observando e levando flores para eles iram carregando. Sim, todos carregavam grandes quantidades de flores que iam recebendo de mulheres, que suponho que sejam conhecidas deles. Nós íamos observando a parada e caminhando em direção ao lago onde seria feita a queima do boneco de neve. Havia muitos turistas e pessoas na cidade naquele dia, fazendo com que andássemos bem devagar até lá. Mas observamos algumas coisas diferentes no caminho, como por exemplo, o grupo de pescadores jogando peixes nas janelas das casas que estavam abertas pelo caminho. E eles acertavam muitos! Bom, chegamos na praça do boneco, que fica em frente à ópera, mais ou menos meia hora antes de começar a queima. Já estava bem lotado e encontramos um lugar de onde pudéssemos ter uma boa vista. Vocês devem estar curiosos para saber como um boneco de neve queima e como a cabeça dele explode. Na verdade, não é um boneco de neve de verdade, e sim feito de rojões, que ficava no alto de uma fogueira bem grande feita de madeira. O melhor jeito de se imaginar isso, é pensar numa daquelas fogueiras que usavam para queimar bruxas, só que com um boneco no topo. Pontualmente às seis horas a fogueira foi acesa e depois de uns dez minutos o boneco começou a pegar fogo e explodir, mas a cabeça só explodiu depois de 17 minutos, o que é um tempo regular, que vai significar um verão mediano. Saímos de lá e voltamos para a estação de trem para pegarmos o trem de volta para St. Gallen, já que não havia nenhum lugar aberto para a gente comer algo. É claro que tudo era muito organizado e limpo e já havia muitos carros de limpeza pelas ruas que já colocavam a cidade em ordem. Os membros dos grupos que desfilavam iam para as suas sedes e continuavam a comemorar, comendo e bebendo. Por volta das 8 e meia, já tinha chegado em St. Gallen, para descansar para o dia seguinte.
É interessante que as pessoas participam efetivamente desse festival, levando as crianças para ver a queima, se vestindo e desfilando, levando flores... É claro que eles também usam esse feriado para beber e não trabalhar, mas o significado vai além disso. Não imagino os paulistanos participando de um desfile de sete de setembro, todos só usam esse dia pra viajar e causar trânsito. Apesar de parecer ser um ritual primitivo e sem sentido (por que achar que o clima vai depender da queima de um boneco?), ele funciona como um rito de passagem, havendo uma mudança na condição das pessoas depois disso. Esse é o ponto em que eu queira chegar, de que não é só a temperatura que muda as pessoas, mas alguns eventos feitos pelas próprias pessoas fazem isso. Nas cidades, como já disse, a mudança natural não é tão perceptível, por isso existem esses eventos culturais, reproduzidos pelas pessoas, que fazem que todos percebam isso. Aí se percebe o grande dilema antropológico da relação entre natureza e cultura. O que é natural e o que é cultural? Esses festivais são reproduzidos graças a uma tradição, que é cultural, mas estão associadas a eventos naturais. Essa espécie de mudança de comportamento que eu observei faz parte da natureza humana ou faz parte da cultura de que após tal dia começa a primavera? Pelo que já disse, existem evidências para os dois lados, de que as pessoas mudam porque está mais quente, mas também porque tomam consciência de que mudou a estação. Não dá realmente para se definir.
Quanto a essa parte cultural, existem sutilezas que fazem muita diferença, como o simples colocar de canteiros de flores no meio da cidade, que faz as pessoas se sentirem em contato com a natureza, vivenciarem a primavera. O mesmo ocorre com possuir um parque bonito e bem preservado no meio de uma metrópole, como no caso de Londres, que parece ter muito mais natureza do que São Paulo.

Acabei escrevendo algumas coisas um pouco complicadas, complexas e confusas, mas espero que de para se entender o que quis dizer. Acabei, também, me alongando demais e acho que vou deixar para outra hora escrever sobre outro “festival” que fui, que tem um caráter menos primaveral e mais cívico que são é o Landsgemeiden de Appenzell. Só para dar uma idéia, trata-se de um pequeno cantão suíço, onde as decisões são tomadas com base numa democracia direta, ou seja, todos votam para todas as decisões. E essas decisões são tomadas uma vez por ano, quando todos se juntam na praça central para votar. E o que torna esse evento mais exótico é o modo como ele acontece, com as decisões sendo tomadas com base na contagem do número de mão levantadas. Depois explico melhor.

Depois tenho que contar também sobre meus passeios nas cidades próximas do lago Konstanz/Bodensee, que tem sido ótimos exemplos da primavera européia.

Um comentário:

  1. Du,
    Pela sua contagem vc jogou um pouco acima do seu par que seria 36. Saiu desse mês e o seu index é 26,9. Estou melhorando e o meu é 27. Da nossa panela, o melhor é o Dominik com 16,7 e sua mulher, Deborah com 13,9!!!
    Ir a Lins, apesar da distancia, faz bem para mim e volto com a bateria carregada. Fui ver a Praça com o nome de meu pai e achei melhor que esperava. Ainda não está urbanizada mas as ruas ao seu redor são todas asfaltadas. Pretendo falar com a prefeitura e plantar árvores frutíferas~(manga, pinha, acerola, pitanga). Acho que não vai ter problema pois nas ruas de Lins tem laranjeiras, mangueiras e no cemitério mangueiras com as frutas mais saborosas.
    A Mara, amiga da tia Lena e que é psicóloga, disse que o terceiro filho é o mais problemático por experiencia própria do seu consultório. Será? O Pit é tão bonzinho!!!!!!!

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