segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Nono e décimo dias


É engraçado que quando a gente viaja o modo como sentimos o tempo passar muda ao mesmo tempo em que o tempo passa e vamos nos acostumando, com um novo ambiente, um novo estilo de vida. No começo, sentimos os minutos, de modo que as horas demoram a passar e tudo o que fazemos parece ter uma importância enorme, mesmo que seja só ir comprar água no supermercado, ou pegar um ônibus. Com a adaptação, passamos a contar as horas, mas, ainda assim, os dias demoram a passar. Tudo se passa como se os dias fossem como anos e que o momento de ir dormir, fosse como uma celebração de um ano novo. As semanas e os meses ainda parecem ciclos de tempo longos os bastante para que não possamos a sentir a sua existência. Mas após alguns dias na nova cultura, as pessoas se acostumam e esses passam mais rápido e tornando-se a unidade de conta do tempo. Acho que só depois de muito tempo, os dias são substituídos por semanas e meses.
É isso o que está acontecendo comigo agora, apesar das diversas novas experiências que venho experimentado nesses primeiros dez dias aqui. Esses dois últimos dias que proponho relatar passaram bem rápido na minha percepção. Estou lendo cada vez melhor em cirílico, o que faz com que eu me sinta cada vez menos analfabeto, apesar de não entender o significado da maioria das coisas que leio. Tem muitas palavras parecidas com outras línguas e, desse modo, apesar de eu não estar me dedicando muito a aprender russo, todo dia novos conjuntos de letras se transformam em conteúdo apreensível. Acho que logo vou saber os nomes das comidas, porque é o que eu gosto de aprender e porque, comendo, todos os dias, facilmente algumas palavras se tornam conhecidas. Acho que tentar explicar o porquê dessa adaptação, como ela ocorre e como o modo de sentir o tempo muda, seria uma tese que demandaria muito trabalho e acho melhor parar por aqui.
Ontem, após acordar meio tarde, pelo fato de praticamente não ter dormido na noite anterior. Os planos como disse eram ir ao Hermitage, alguma hora do dia, mas me lembrei que os tíquetes que eu tinha para o museu russo ainda eram válidos, de modo que seria besteira desperdiça-los. Assim, decidi ir ao Marble Palace, que faz parte desse museu e possui algumas exposições temporárias. O indonésio, Bagas, me acompanhou, porque é o único que não fica o dia inteiro dormindo no hotel e está disposto a fazer coisas diferentes a não ser ir para festas e dormir durante o dia, que já é curto. O prédio é belíssimo, com diversos detalhes em mármore, como o nome diz, e havia algumas exposições interessantes. Primeiro, era uma sobre propagandas de produtos durante as décadas de 1920 e 1930. Elas eram muito bem feitas, sendo praticamente arte, quando comparadas com as dos dias de hoje. Os desenhos dos pôsteres eram, muitas vezes, bem divertidos e bem desenhados. Depois havia uma exposição de fotos de pessoas importantes russas dos anos 1960 até 1980. Todas as fotos eram em preto e branco, algumas posadas e outras espontâneas, como que tiradas por paparazzi. A exposição dizia que esse segundo tipo de foto era raro durante o período soviético, não devido ao regime, ou alguma censura, mas porque as pessoas não consideravam correto fazer isso. Assim, essa exposição buscava mostrar aos russos os seus heróis de modos que eles não podiam ser vistos anteriormente. Mesmo não conhecendo a maioria dos personagens (na verdade só conheço os maestros, músicos e compositores), a exposição trazia diversas fotos bem bonitas. Por último tinha uma exposição sobre arte moderna, na qual haviam até um Picasso e um Andy Warhol. Essa exposição era pequena e a menos interessante dentre as outras. Depois de sair de lá, fui almoçar no restaurante que vou todos os dias e também para um tipo de mercado que fica na avenida principal, próximo ao hostel.
Quando voltamos ao hostel era quase hora de ir para a ópera, conforme havia combinado com algumas pessoas. Na verdade, não queria ir com muitas pessoas, porque elas são meio que inexperientes nesse tipo de ambiente e dá um certo trabalho ensiná-las em certos procedimentos que elas tem que tomar. Mas, como elas são muito lerdas, isso não aconteceu, porque elas não estavam no horário combinado e saímos, então, só eu o Bagas de novo. Chegando no teatro, dessa vez no ônibus certo, tivemos que comprar o ingressos, mas não foi uma tarefa simples, apesar das caixas falarem inglês. Na primeira tentativa, um pouco pela inexperiência do Bagas em comprar ingressos, a mulher disse que o ingresso mais barato custava 1600 rublos. Eu achei estranho, porque eu tinha visto no site ingressos com preços bem mais baixos. Por isso, decidi tentar mais uma vez, mudando de caixa. Dessa vez eu falei diretamente com a mulher e consegui comprar ingressos a 600 e poucos rublos, que nem eram em lugares tão ruins assim. Vai entender a lógica...
Quando entramos no teatro, decidimos dar uma volta para conhece-lo, mas logo uma mulher nos tirou do salão e nos disse que nosso lugar era no andar de cima. Nós não íamos fazer nada a não ser admirar o lugar, mas, novamente, vai entender esses russos... Tivemos que sentar em camarotes separados, porém próximos, após deixarmos nossos casacos na chapelaria. O teatro é realmente muito bonito e a produção nem se fala. Acho que nunca vi uma ópera tão bem montada e com tantos detalhes, com cenas que acho que chegavam a ter quase 100 pessoas no palco. Era a ópera Sadko, do Rimsky-Korsakov, que eu não conhecia nem de nome, mas que é bem legal. É baseada em uma lenda russa da cidade de Novgorod. A parte musical não era extraordinária, como a produção, mas não chegava a ser medíocre, apesar de alguns escorregões do maestro e de alguns cantores. Acho que os teatros daqui se aproveitam dos feriados para apresentar o maior número de produções possíveis e assim ganhar o máximo de dinheiro, não tendo tempo de se preparar do modo que deveriam.
Na saída do teatro, tínhamos que pegar o ônibus de volta, mas quem disse que conseguimos? Assim, fomos voltando andando, na expectativa de que algum ônibus na direção certa passasse, o que aconteceu somente quando não estávamos perto do ponto. Mas a caminhada não é muito longa e a vista da cidade a noite compensa o esforço. O problema é que nós estávamos usando uma roupa meio social, que não é a coisa mais quente do mundo, por isso não dava pra ficar muito tempo parado. Parei para tomar um lanche no Subway e depois dormi muito bem.
Hoje de manhã, acordei meio cedo pra me preparar para a viagem. Acho que não expliquei ainda, mas consegui o meu lugar no trabalho no winter camp que eu havia dito. É bem longe daqui, cerca de 17 horas de viagem, numa cidade chamada Kostroma. Não sei exatamente o que vou fazer lá, mas tem algo a ver com dar aulas de inglês e de finanças. Se não for muito bom, pelo menos é um trabalho, num lugar diferente e o projeto está pagando por isso. A viagem era para ser hoje, mas o trem estava cheio e por isso só vou amanhã. Me prometeram comida e internet lá, por isso acho que não vou ter problemas de comunicação por lá. Além disso, a cidade que eu vou não é tão pequena assim.
Saí para comprar suprimentos para a viagem, como chocolate, água e biscoitos e acabei chegando na Stockmann, uma grande loja de departamentos finlandesa, que me trás boas recordações. O andar de alimentos é fantástico, com muitas coisas apetitosas. Pena que eu não tenho uma cozinha decente aqui pra poder aproveitar melhor isso. Na verdade, eu fiquei enrolando naquela loja, que está agregada a um shopping até a hora em que eu teria uma reunião sobre as preparações para o projeto em que vou trabalhar (que vai começar no dia 13 de janeiro). Quando era 12h45 fui para o ponto de encontro e encontrei com a Madina, que trabalha no projeto e fomos buscar as outras meninas que estavam perdidas por ali. Reunidos todos fomos para um restaurante/café, que era muito bom em relação à comida e ao ambiente. Logo, o Ivan, que é o coordenador do projeto chegou e, depois de comermos, começamos a conversas sobre como será o projeto. Parece que vai dar tudo certo e já temos três escolas para trabalhar e agora é só preparar as apresentações. Tenho algumas ideias para elas, mas estou um pouco decepcionado com as outras pessoas do grupo, porque elas não sabem muito sobre economia e finanças. É estranho elas virem para o projeto sem muito background, mas acho que daremos algum jeito de tudo dar certo. Agora estou um pouco mais tranquilo em relação o projeto, já que temos um calendário e trabalho. O mesmo não acontece com a Carol, que a cada dia enfrenta mais incertezas, e com quem eu falei em seguida. Eu disse pra ela talvez tentar mudar de projeto, ou cidade, ou mesmo país. Quem sabe ela não acaba vindo pra Rússia comigo?
Na volta pro hostel decidi vir a pé, pra conhecer melhor a cidade, e valeu a pena, porque não era longe. As ruas estão bem cheias em decorrência do feriado, com muitos turistas. Talvez eu saia hoje de novo com o pessoal do projeto, já que eles vão fazer patinação no gelo por toda a noite e isso me parece uma coisa bem russa. Vou pegar emprestado o patins do Bagas, porque ele não vai, já que quebrou o pé fazendo um tipo de ski-bunda hoje. Se eu for, vou tomar cuidado pra eu voltar ileso.
Não se esqueçam de continuar olhando as fotos!

3 comentários:

  1. Oi Du ,
    O Ano Novo foi mto divertido e com gde variedade de comida. A tia Lena caprichou ... Dormimos todos lá e a comilança continuou no dia seguinte . Foi realmente, mto bom . Festa de família !!!
    Pelo visto vc tem aproveitado bem a sua estada em St.Petersburgo. Logo, começa o seu trabalho e, então terá menos tempo pra conhecer os lugares que o fazem feliz. A companhia de amigos tbem é mto importt pra aprender a viver .
    Acho que vc está no lugar certo e na hora certa ...
    Bjos,
    Tia Mi

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  2. Oi Edu

    Boa Noite ! Feliz 2011, pelo visto você já iniciou em Grande estilo !
    Bem não comentei no outro dia mas, li e torci, para vc vencer no par ou impar, acho que vc já está a caminho, do trabalho mencionado.Por aqui em Mogi, o inicio do ano foi com muita chuva, já fazem 3 dias de chuva, e para variar, parece que SP , já teve, sua cheia nas ruas...
    Falando do Rimsky Korsakovy, esse eu já conhecia, apesar de não saber lhe dizer as musicas, mas pelo que lembro vagamente, ele teve uma muisica no filme "Algum lugar no Passado".
    Acho, que a Yuubi, não terá a mesma chance de ir a uma ópera , bem elaboarada, ou sequer ter a chance de ir ver algo semelhante e bem elaborada, pela India...se lembro bem em Bolywood, fazem tudo meia boca, tentando imitar o cinema americano, fico imaginando o que será, que por lá é bem feito ???? Um país milenar, mas que vive num passado bem rudimentar, onde nem as coisas mais simples como ter agua e luz é algo normal? será que tudo isso, é por que tem muita gente?
    Vou escrever aqui no comentario seu( com certeza a Yuubi vai le-lo, para que saiba um pouco da India), mas faz mais ou menos 30 anos atrás na epoca da Indira Ghandi, a India, na tentativa de reduzir a natalidade, dava um GUARDA CHUVA, para a familia, onde o pai fizesse vasectomia, ou que mãe retirasse o utero ou fizesse laquedurua das trompas...isso é só 30 anos atrás...então realmente a coisa, é lenta e rudimentar.
    Neste caso a Russia, deve ter mudado bastante após o fim da Guerra Fria, e evoluido, mais rapidamente, alem do que os antigos governantes russos eram apreciadores de arte, incluisive nas vestimentas, dos monarcas( Qsares??).
    Sobre o tempo é isso, tudo no inicio é uma novidade, mas o tempo e a convivencia, faz o tempo e as coisas, ficarem como rotina e aí td fica como se a gente estivesse vivendo localmente por muito tempo. acho que as coisas, vão ficando mais familiar e os nossos habitos se moldando a cultura do local. e nisso o senso temporal muda.

    abraços

    luis yabase

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  3. A India realmente eh um lugar estranho. Eh dificil explorar tudo que tem para ser visto por aqui.
    Mas que bom que vc conseguiu neh? XDD Vai comecar um desafio diferente agora. Ainda bem que vc esta com um cronograma acertado!! A Russia eh tao legal!! Olhe as minhas nao muito boas dicas ja que agora vc ja conhece a russia melhor do que eu, mas ainda assim,ando comentando as suas fotos. Boa sorte na sua viagem!!
    Bjos!!

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